subterfúgio ou o homem de vidro

a sensação estranha que me perturba hoje o corpo incomoda e distrai.
não consigo ver com clareza e fico assustado,
não percebo o que me aflige e me mantém acordado.
persisto.

a noite já vai longa e eu forço-me a continuar.
quero abrir a janela e saltar mas não encontro sequer a força necessária para o fazer.
no jardim vejo pirilampos que brilham apesar de toda a escuridão. não me encontro são.

desejava sobretudo poder existir sem dor nem queimaduras na pele. que fraco que sou..
não sei se hei de continuar a escrever ou simplesmente esquecer e beber e sofrer até morrer. não.. quem morre são os cobardes.

a cobardia nunca foi minha amiga, nunca foi uma opção.
fugir da violência e dos gritos era somente uma possibilidade no reino do fantástico em que me refugiava por obrigação.
não queria ser visto como frágil ou hábil ou sórdido.. hábil com os mecanismos de refúgio, hábil com os meios de fuga. hábil a obedecer. hábil a perder. indigno de viver.

temia há bastante tempo que isto me pudesse acontecer mas não posso crer agora que o estou a viver e consigo ver o que me faz tremer.
estúpido. inútil para além da inutilidade, fútil para além da futilidade, indigno para além da possibilidade. que martírio.
mártires.. se me pudesse considerar um seria tudo mais fácil. mas não quero mentir. não vale a pena. não valho a pena.

a sensação estranha que me perturba hoje o corpo incomoda e distrai.
vejo tudo com uma sensibilidade estranha e melhorada e fico assustado,
não percebo o que me aflige e me torna desesperado.
persistiria se soubesse como. 
lanço-me pela janela fechada. 
os vidros partem-se. o meu corpo também.

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